"Aquelas águas azuis marcando a linha do horizonte entre o manto verde de esperança das folhas e a pequena cidade de Sirmione. Ah, Sirmione! Como és bela, em teu quintal. Teu perfume nos transporta ao mais sereno sono.
Já no interior da pequena cidade, lá estava eu parada diante daquela estrutura tão maravilhosamente rústica, construída na Alta Idade Média. A Igreja San Pietro. A janelinha arrendondada no topo e a porta de madeira transmitem um total esplendor a quem está de fora, nos obrigando a entrar, de tamanha curiosidade. Tanto nos obriga que entrei.
Como era belo o seu interior, com detalhes magníficos. No altar, velas em candelabros tão antigos quanto a própria igreja. As imagens no teto reluziam com a claridade das velas, mostrando a perfeição de sua magnitude.
E na serenidade do ambiente, ocorreu um estrondo ensurdecedor. Com o susto, meus óculos caíram no chão, e quando ia me abaixar para apanhá-lo as portas da igreja se escancararam com a entrada de uma pequena multidão. Mas o que era aquilo? Então logo veio o padre ver o que acontecia. E só depois de muita confusão, foi esclarecido o motivo de tanto desespero: a igreja de San Pietro seria demolida. O governo italiano anunciara um decreto de demolição da igreja, por apresentar riscos à sociedade; riscos de desabamento. Mas como seria possível? Um patrimônio tão estonteante ia ser demolido? Mas infelizmente era verdade.
Logo toda a cidade se comoveu, e até as suas águas já não pareciam tão azuis como antes. Enfim chegara o dia. Chegaram homens de todos os lados e com eles, as máquinas. Próximo à igreja, muitas pessoas choravam, outras mostravam indignação. Chegara a hora. Vi então aquela cena em câmera lenta, as máquinas se aproximando de San Pietro. Congelei a imagem, nos meus pensamentos: não podia ver aquilo acontecer. Tinha que sair dali. E quando dei por mim, estava parada entre a igreja e as máquinas. Todos me observando. As máquinas avançando. Então outra pessoa se juntou a mim, e outra, e outra. Até que já não havia mais espaço naquele lugar...
Hoje é meu aniversário. Mas este ano a comemoração é diferente. Diferente como? Bem, a começar por eu ter deixado todos meus amigos e familiares e estar dentro de um avião ‘sozinha’. A propósito, me aproximo do meu destino. Já tinha me esquecido como era linda a vista aqui de cima. O mar, a cidade... É hora de pousar!
As águas, o vento, as construções; e a igreja San Pietro. Exatamente como há trinta anos. Talvez até mais bela. Mais esplendorosa. Aceitei o convite pela segunda vez e entrei. Perdi-me novamente nas imagens do teto e na minha vertigem cheguei ao altar. Ajoelhei, abaixei a cabeça, emocionei-me. Ergui meus olhos então. Mas não era possível. Eram os meu óculos que estava ali, os mesmos óculos de armação grossa e quadrada que deixei cair e não tive tempo de pegar há muitos anos. Não tão brilhantes como eram, mas agora com uma importância imensurável.
Ainda de joelhos, agradeci, mais uma vez, por aquele encontro com a igreja que, se talvez não fosse por minha paixão, hoje não existiria mais ali. Missão cumprida. Era hora de partir. Meu maior presente."
Wanessa Ferreira de Oliveira (in memoriam)
Este texto literário (conto) foi produzido pela Wanessa, no curso “Específica de Redação: oficina de textos” (Centro Educacional SESC Cidadania), no 1º semestre de 2008, sendo publicado no livro digital "Sirmione: olhares de artista".
Já no interior da pequena cidade, lá estava eu parada diante daquela estrutura tão maravilhosamente rústica, construída na Alta Idade Média. A Igreja San Pietro. A janelinha arrendondada no topo e a porta de madeira transmitem um total esplendor a quem está de fora, nos obrigando a entrar, de tamanha curiosidade. Tanto nos obriga que entrei.
Como era belo o seu interior, com detalhes magníficos. No altar, velas em candelabros tão antigos quanto a própria igreja. As imagens no teto reluziam com a claridade das velas, mostrando a perfeição de sua magnitude.
E na serenidade do ambiente, ocorreu um estrondo ensurdecedor. Com o susto, meus óculos caíram no chão, e quando ia me abaixar para apanhá-lo as portas da igreja se escancararam com a entrada de uma pequena multidão. Mas o que era aquilo? Então logo veio o padre ver o que acontecia. E só depois de muita confusão, foi esclarecido o motivo de tanto desespero: a igreja de San Pietro seria demolida. O governo italiano anunciara um decreto de demolição da igreja, por apresentar riscos à sociedade; riscos de desabamento. Mas como seria possível? Um patrimônio tão estonteante ia ser demolido? Mas infelizmente era verdade.
Logo toda a cidade se comoveu, e até as suas águas já não pareciam tão azuis como antes. Enfim chegara o dia. Chegaram homens de todos os lados e com eles, as máquinas. Próximo à igreja, muitas pessoas choravam, outras mostravam indignação. Chegara a hora. Vi então aquela cena em câmera lenta, as máquinas se aproximando de San Pietro. Congelei a imagem, nos meus pensamentos: não podia ver aquilo acontecer. Tinha que sair dali. E quando dei por mim, estava parada entre a igreja e as máquinas. Todos me observando. As máquinas avançando. Então outra pessoa se juntou a mim, e outra, e outra. Até que já não havia mais espaço naquele lugar...
Hoje é meu aniversário. Mas este ano a comemoração é diferente. Diferente como? Bem, a começar por eu ter deixado todos meus amigos e familiares e estar dentro de um avião ‘sozinha’. A propósito, me aproximo do meu destino. Já tinha me esquecido como era linda a vista aqui de cima. O mar, a cidade... É hora de pousar!
As águas, o vento, as construções; e a igreja San Pietro. Exatamente como há trinta anos. Talvez até mais bela. Mais esplendorosa. Aceitei o convite pela segunda vez e entrei. Perdi-me novamente nas imagens do teto e na minha vertigem cheguei ao altar. Ajoelhei, abaixei a cabeça, emocionei-me. Ergui meus olhos então. Mas não era possível. Eram os meu óculos que estava ali, os mesmos óculos de armação grossa e quadrada que deixei cair e não tive tempo de pegar há muitos anos. Não tão brilhantes como eram, mas agora com uma importância imensurável.
Ainda de joelhos, agradeci, mais uma vez, por aquele encontro com a igreja que, se talvez não fosse por minha paixão, hoje não existiria mais ali. Missão cumprida. Era hora de partir. Meu maior presente."
Wanessa Ferreira de Oliveira (in memoriam)
Este texto literário (conto) foi produzido pela Wanessa, no curso “Específica de Redação: oficina de textos” (Centro Educacional SESC Cidadania), no 1º semestre de 2008, sendo publicado no livro digital "Sirmione: olhares de artista".
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